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RÁDIO SOM DA PALAVRA

sábado, 9 de dezembro de 2023

Texto e contexto: Todo pastor é [ou deveria ser] teólogo?



 Os evangélicos e as igrejas evangélicas nunca tiveram tanta notoriedade como nos últimos anos. Não é coisa rara você se deparar com pastores e cantores evangélicos em programas de grande audiência em canais de destaque na TV aberta. Sem contar a visibilidade que muitos construíram de forma independente na internet, como canais do Youtube e em outras redes sociais.


Cada entrevista dada por um pastor e cada música cantada comunicam uma mensagem teológica. Milhares de pessoas, cristãs e não cristãs, estão consumindo, ou pelo menos ouvindo, mensagens que falam sobre a Bíblia, Jesus e o evangelho. A pergunta que se coloca é qual a teologia que está sendo comunicada e assimilada por quem recebe essas mensagens?


Neste cenário de inúmeras vozes comunicando aos quatro ventos se faz imprescindível a figura e o papel do pastor. Mas nesta disputa de narrativas, como o pastor de uma igreja local pode atuar como teólogo para instruir sua comunidade de fé? Afinal, todo pastor é ou deveria ser um teólogo? Todo teólogo é um pastor? O que há em comum entre um e outro?


Jorge Henrique Barro afirma[i] que pastores precisam de uma revisão ministerial para discernir o lugar e o papel da teologia em seus ministérios pastorais. “É preciso entender e reconhecer que a teologia não está confinada nos três ou quatro anos dos seus estudos teológicos (e isso para quem fez) seja qual for a escola que estudou”, argumenta Barro. Ele acrescenta:


“A teologia jamais deveria ocupar um lugar secundário na vida dos pastores. É lindo e emocionante ver um pastor sintonizado com seu tempo, trazendo para o púlpito alimento sólido, histórias redentivas do amor de Deus, sinalizando caminhos para o povo de Deus possa seguir em esperança. Ser um pastor-teólogo é viver na encruzilhada do texto com o nosso contexto. Um pastor que pouco lê, pouco tem a dizer.”


Para que serve o pastor e porque existe a igreja?


Na introdução do livro Tornando-se um Pastor-Teólogo[ii], Todd Wilson e Gerald Hiestand afirmam que os pastores estão passando por uma crise de identidade – eles não sabem quem são nem o que deveriam fazer. Eles escrevem: “Por trás dos sorrisos generosos, dos sermões inspiradores, das campanhas multimilionárias de construção e de expansões ministeriais cada vez maiores, está escondida no coração e na mente de muitos pastores a confusão quanto ao que o pastor deve ser e o que deve fazer.”


É provável que não exista outra pro­fissão que sofra com tanta falta de clareza quanto ao signi­ficado do trabalho. Talvez esse seja o motivo pelo qual tantos pastores renunciam ao cargo todos os anos, abandonam o ministério sem nunca desejarem voltar ou fazem tentativas quase sempre insanas de ocultar a confusão e o desgaste que sentem com diferentes formas de automedicação, que vão de bebida, pornogra­fia, casos extraconjugais, comida em excesso, obsessão por dinheiro ou poder ao completo desapego emocional da vida das pessoas que eles pastoreiam – ou do próprio Deus.


Kevin Vanhoozer, também no livro Tornando-se um Pastor-Teólogo, fala sobre a crise de identidade dos pastores. Para ele, os pastores precisam recuperar sua vocação e identidade como teólogos públicos locais, pois disso depende o bem-estar da igreja e sua missão. Para Vanhoozer, na verdade, essa questão trata-se de pensar não muito nos pastores e sim nas igrejas e se perguntar: para que servem os pastores e porque existe a igreja em vez de nada?


A falsa dicotomia entre conteúdo e prática


Jorge Henrique Barro comenta que um problema muito frequente é a falsa dicotomia entre conteúdo e prática. Muitos pastores dizem que seu ministério é prático e não acadêmico, quando, na verdade, toda prática está fundamentada em conceitos. Resta saber se com conceitos bons ou ruins.


No capítulo três do livro Tornando-se um Pastor-Teólogo, Kevin Vanhoozer também aborda a dicotomia “pastor versus teólogo” e explica: “Confinamos a teologia em uma ciência teórica, uma especialização, e o pastorado, em uma esfera prática, uma profissionalização. O resultado é que já não encorajamos os alunos mais inteligentes no seminário a obterem seus PhDs para que possam servir à igreja, e, ao mesmo tempo, obter um PhD para servir na academia não é visto como algo tão útil assim. Por um lado, temos teólogos que não praticam a teologia. Por outro, temos pastores que podem interpretar o estudo, mas eles mesmos não conseguem fazê-lo.”


Comentando sua outra obra, O Pastor Como Teólogo Público[iii], Kevin Vanhoozer afirma que o pastor deve ser um teólogo e que ser um pastor-teólogo é mais desafiador do que ser um professor ou acadêmico, já que, segundo ele, o professor só precisa saber as coisas, enquanto o pastor precisa ser sábio. Vanhoozer defende ainda que pastores precisam ser teólogos porque a Igreja existe para servir o mundo. Ele argumenta:


“Os pastores não são teólogos apenas para suas congregações locais. A Igreja existe para servir o mundo. A Igreja é a força motriz de uma nova criação. Renovar a criação é o projeto teológico final. E o pastor supervisiona produções locais que nos proporcionam um antegozo desse reino de Deus.”[iv]


Para Vanhoozer, teologia é o projeto de buscar falar e mostrar entendimento daquilo que o Deus trino está fazendo em Jesus Cristo e por meio dele pelo bem de todo o mundo, e isso é muito importante para ser deixado para os acadêmicos. Vanhoozer compreende a teologia pública como a teologia que se refere a pessoas. “Igreja é um público, igreja se reúne num local. Por isso ser pastor é mais desafiador que ser teólogo, porque você precisa lidar com as pessoas. Não só trabalhar com as pessoas, mas ao lado delas. Se você é pastor, as pessoas são o meio de sua teologia. Está tentando moldar essas pessoas para serem uma nação santa, o povo de Deus em determinado local”, argumenta o autor. Ele lamenta[v] que muitos alunos de teologia preferem seguir a carreira acadêmica teológica porque não têm bons referenciais de pastores teólogos.


Oito marcas de um pastor-teólogo

“O pastor-teólogo entende os tempos e épocas. A teologia não acontece no vácuo, do nada. Um púlpito e educação cristã sem realismo e realidade conjuntural é desprovido de sentido para as pessoas. Pastores precisam levar a sério o hoje, os fatos, os acontecimentos, os noticiários. A palavra do Senhor precisa vir para esses contextos. Deus nos chama para termos palavra para o nosso tempo. Pastores que não sabem fazer pontes entre os tempos bíblicos e os tempos presentes precisam prestar atenção à hermenêutica!”

“O pastor-teólogo entende o plano de Deus para o mundo. “A reflexão teológica que não está a serviço da missão de Deus é um despropósito. A missiologia é a mãe da teologia. Não estudamos teologia por causa da teologia. Estudamos para entender e para desenvolver a missão de Deus no mundo. Sem missão, a teologia se trunca, disse Orlando Costas. Por isso, todo pastor deve ser um teólogo da missão. O ministério pastoral não é um fim em si mesmo; é um meio para equipar o povo de Deus para cumprir a missão de Deus!”

“O pastor é um geógrafo social, alguém que deseja “escrever” o evangelho na mente e no coração de um povo reunido em um determinado lugar. “O pastor de uma igreja local é um construtor de lugares cuja missão é transformar uma congregação em um lugar adequado para o Espírito de Cristo, um lugar no qual certas atividades promoverão a cidadania celestial coletiva sob condições terrenas históricas. O pastor deseja ajudar cada membro do rebanho a encontrar seu lugar no mundo, a saber seguir a Cristo aqui e agora como discípulo dele.”

“Os pastores devem conduzir seus rebanhos a águas mais profundas do batismo, mais profundas naquilo que o Deus trino está fazendo na – e por meio da – morte e ressurreição de Jesus. É assim que eles cumprem a Grande Comissão: ‘Vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a obedecer a tudo o que eu lhes ordenei’ (Mt 28.19-20). Pastores fazem discípulos ao conduzirem as pessoas ao que o Deus trino está fazendo em Cristo.”

“Pastores são teólogos públicos porque trabalham com pessoas para pôr a teologia em prática. Esse é um trabalho árduo; é mais difícil trabalhar com pessoas do que com ideias. Se você quiser um desafi­o real, não vá estudar teologia acadêmica; vá para o pastorado. Mas o povo de Deus – as igrejas locais – são os locais públicos onde a vida de Cristo é lembrada, celebrada, examinada e exibida.”

“Existem intelectuais tanto na academia como na sociedade, mas são poucos e raros. Muitos estudiosos são especialistas que sabem muito sobre poucos assuntos, mas não sabem o que falar em se tratando das grandes questões. Os pastores discutem as grandes questões – da vida e da morte, do sentido e da falta de sentido, do físico e do espiritual – com frequência e precisam fazer isso de uma maneira que eles consigam comunicar com os não acadêmicos.”

“O que ameaça o rebanho de Jesus Cristo não são leões ou ursos (1Sm 17.34-35), mas a falsa religião, a doutrina incorreta e as práticas ímpias. Os que lideram precisam, em certos aspectos, estar à frente de sua congregação. Os pastores não precisam ser acadêmicos, mas precisam estar fundamentados na teologia bíblica, o quadro histórico–redentor completo que une o Antigo e o Novo Testamento e se concentra em Cristo.”

“Os pastores não são chamados a praticar a teologia acadêmica, mas a ministrar compreensão teológica, ajudando as pessoas a interpretarem as Escrituras, sua cultura e sua própria vida em relação à grande obra de redenção de Deus resumida em Cristo. Mais uma vez, o teólogo é um generalista que fala sobre coisas em geral (a renovada ordem criada) em relação a uma coisa em especí­fico: o evangelho de Jesus Cristo.”




Fonte:https://sepal.org.br/texto-e-contexto-todo-pastor-e-ou-deveria-ser-teologo/

quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

Igrejas evangélicas apresentaram crescimento vertiginoso no Brasil nas últimas décadas

 

Segundo uma pesquisa realizada pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM) da USP, igrejas evangélicas abriram cerca de 17 novos templos em média, diariamente, no Brasil em 2019. O relatório analisa a expansão desses estabelecimentos no período de 1920 a 2019, juntamente com a localização dos Estados de maior predominância evangélica. Victor Araújo, cientista político da Universidade de Zurique e pesquisador associado ao CEM, comenta que o avanço dessas instituições apresenta origens diversas. 


O pesquisador explica que, para entendermos o novo relatório, é interessante compreender como os dados sobre religiões costumam ser distribuídos para a população. A cada dez anos, os censos demográficos são levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e, entre as diferentes informações sobre a população nacional, é divulgado o número de evangélicos presentes no País. 


As pesquisas de opinião pública também são utilizadas para analisar a quantidade de indivíduos que pertencem a esse grupo, principalmente em períodos de eleições. “O que eu estou propondo é um novo método para mensurar o contínuo crescimento desse segmento religioso no País utilizando dados da Receita Federal”, discorre Araújo. 

Isso é possível pois, no Brasil, as igrejas são como empresas, com um grande número delas apresentando CNPJ. Com esse dado, é possível analisar a data de criação, onde elas foram fundadas e o panorama de manutenção dessas instituições.


Além disso, Araújo comenta que o estudo não avalia apenas o crescimento quantitativo desses locais, mas também leva em consideração as características e especificidades de cada um desses locais. O projeto segue para uma segunda etapa em que se avalia a extensão dessas informações para até o ano de 2023; dessa forma, será possível acompanhar o crescimento das igrejas evangélicas ano após ano. 


O estudo também avalia quais são os tipos de igreja evangélica que estão crescendo; para isso, é feita uma divisão entre quatro grandes grupos: missionários — dentro dele estão as igrejas batistas, presbiterianas, metodistas, entre outras; pentecostais — como a Assembleia de Deus, Deus é amor, Igreja Quadrangular, etc.; neopentecostais — que apresentam uma tradição mais recente do pentecostalismo; e, por fim, a categoria que mais cresce no Brasil, que são as igrejas de classificação não determinada. 


Detalhes

É interessante notar que o evangelicalismo chega no Brasil no início dos anos 1900 e começa com trabalhos de missão sobretudo no Norte e no extremo Sul do País. Apesar da tentativa, até os anos 50 pouquíssimas igrejas são aberta; é apenas a partir do anos 60 que um crescimento substantivo pode ser notado. O maior avanço da expansão das igrejas evangélicas no Brasil aconteceu em meados dos anos 90 até 2016/2017. “A gente passou de cerca de 100 igrejas nos anos 60 para mais de 60 mil templos em 2015. Então a gente tem um crescimento vertiginoso nas últimas décadas”, explica o pesquisador. 


Araújo também destaca que esse crescimento não está espalhado de forma homogênea pelo território nacional, ele acontece primeiro no Sudeste e vem crescendo, nos últimos tempos, na região Centro-Oeste. “Existem poucos precedentes na história recente do mundo de um crescimento de uma transição religiosa tão acelerada como essa que a gente está vendo no Brasil”, aponta. Para destacar essa questão, Araújo cita o exemplo europeu, que demorou cerca de 500 anos para realizar a mesma transição religiosa que o Brasil acompanhou em poucas décadas. 


Entre os diferentes motivos que podem explicar o avanço desse crescimento, notam-se três pontos que podem resumir bem a questão. O primeiro deles refere-se ao fato de o Brasil ter se tornado um país mais urbano a partir da década de 60; com a migração de indivíduos em busca de melhores condições de vida, as pessoas passaram a integrar igrejas que se localizam perto de suas casas, na maioria das vezes, essas eram evangélicas. 


Além disso, em 2003, com a aprovação da Lei nº 10.825/2003, há um incentivo muito maior para a abertura de templos no Brasil. Por fim, com o aumento do número de instituições e com o fortalecimento econômico desses locais, o investimento em telecomunicações aumenta e passa a atrair um número maior de fiéis para as igrejas. “Essas coisas meio que se retroalimentam, a ordem aqui geralmente é: mais igrejas abertas, mais fiéis, mais coleta de dízimo e mais capitalização”, finaliza Araújo. 



Fonte:https://jornal.usp.br/radio-usp/igrejas-evangelicas-apresentaram-crescimento-vertiginoso-no-brasil-nas-ultimas-decadas/


terça-feira, 5 de dezembro de 2023

O que explica multiplicação de templos evangélicos no Brasil




Eles eram minoria, mas podem ser maioria nos próximos anos. Nas últimas três décadas, o número de evangélicos cresceu rapidamente no Brasil, país onde a espiritualidade tem um papel preponderante na sociedade.


Uma faceta desta expansão do protestantismo no Brasil é a multiplicação de templos, como mostra uma pesquisa realizada pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM/Cepid) da Universidade de São Paulo (USP).


De 17.033 templos evangélicos, em 1990, o Brasil passou a contar com 109.560, em 2019. Um aumento de 543%.


Apenas em 2019, último ano do levantamento, 6.356 templos evangélicos foram abertos no Brasil — uma média de 17 por dia.


Fonte:https://www.bbc.com/portuguese/